Lava Jato abastecia site da extrema direita, em troca de camaradagem


O procurador Deltan Dallagnol vazava notícias para o site O Antagonista, revelam mensagens trocadas entre ele e o jornalista Diogo Mainardi

Segundo a Intercept, a Lava Jato usou site O Antagonista para interferir na escolha do presidente do Banco do Brasil, mas a parceria teria começado muito antes.


Por Redação – Correio do Brasil (RJ)


A troca de mensagens espúrias entre os integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato, em Curitiba, e o site de ultradireita Antagonista, comandado pelo apresentador de TV Diogo Mainardi, foi exposta em um vazamento para a agência norte-americana de notícias The Intercept Brasil, nesta segunda-feira. As repercussões se multiplicam. Para o escritor Paulo Coelho, o site de Mainardi não passa de “um blog de press-releases do governo”.

“As máscaras caíram, mas verdade seja dita, eles hoje em dia piam muito fraquinho. Em breve vão piar apenas o que mandar o Comitê Central (Presidente e filhos)”, acrescentou o autor de alguns best sellers.

Líder do PT, na Câmara, o deputado Paulo Pimenta também opina, em mensagem por uma rede social:

“Quem poderia imaginar?! #LavaJato usou O Antagonista para interferir na escolha do presidente do Banco do Brasil – e a parceria entre os dois não começou aí”, pontua.

Promiscuidade
Segundo a Intercept, a Lava Jato usou site O Antagonista para interferir na escolha do presidente do Banco do Brasil, mas a parceria teria começado muito antes. O site parou de publicar notícias sobre escândalo de corrupção a pedido de Dallagnol e procurou o Ministério Público Federal (MPF) para saber quem apoiar na sucessão de Rodrigo Janot, na Procuradoria Geral da República (PGR).

Nos últimos meses de 2018, a força-tarefa municiou com documentos o site comandado pelos jornalistas Diogo Mainardi, Mario Sabino e Claudio Dantas para alimentar notícias que evitassem que o ex-presidente da Petrobras Ivan Monteiro ocupasse a presidência do Banco. Monteiro era o nome mais forte entre os cotados para assumir o BB, uma escolha do ministro da Economia Paulo Guedes – a ele era dado o crédito por ter salvado as contas da Petrobras.

“O caso é o exemplo mais escandaloso de uma relação promíscua entre o grupo comandado por Deltan Dallagnol e os jornalistas do Antagonista – mas nem de longe o único, como mostram as conversas no aplicativo Telegram que foram entregues ao Intercept por uma fonte anônima e fazem parte da série Vaza Jato, que já publicou 84 reportagens em parceria com os veículos Folha de S. Paulo, El País, Bandnews FM, Veja, BuzzFeed News, Agência Pública e UOL”, afirma a agência.

Mainardi
Ainda segundo a Intercept, “a leitura das conversas deixa claro que a Lava Jato e O Antagonista se veem como parceiros. O site abre mão da função primordial do jornalismo – fiscalizar o poder e os poderosos, aí incluídos procuradores e juízes – e recebe em troca informações em primeira mão. Os procuradores também interferiram, ao menos uma vez, diretamente na direção editorial do site”.

“O comentarista Diogo Mainardi, dono e editor do site, acatou pedido de Dallagnol e parou de publicar notícias sobre um escândalo de corrupção que envolvia a Mossack Fonseca, um escritório de advocacia suspeito de abrir empresas offshore no Panamá. Mainardi também deu dicas de investigação a Dallagnol, que seguiu as pistas do comentarista e em seguida informou-o – em tom lamentoso – de que o caso estava fora da alçada da operação”, continua.

Tacla Durán
A reportagem afirma, ainda, que “em outro caso, os diálogos mostram também que a Lava Jato acreditou num boato repassado por Claudio Dantas para pedir – sem autorização da justiça – a quebra do sigilo fiscal de uma nora do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2016. Para isso, os procuradores acionaram informalmente um contato na Receita Federal. Nada foi encontrado contra ela, que jamais foi indiciada ou acusada de crimes”.

“Em troca do jornalismo chapa-branca, Dallagnol passava informações privilegiadas ao site. Isso fica claro numa mensagem num chat privado de 30 de agosto de 2018, em que o procurador diz o seguinte, ao entregar em primeira mão a Claudio Dantas dados que haviam sido pedidos pelo jornal El País:

“Nao estamos passando pra mais ninguém agora”. Tratava-se de uma resposta da operação a um depoimento do advogado Rodrigo Tacla Duran, um crítico da Lava Jato, na Espanha”, pontua.

Lava Jato
Nos diálogos, segundo apurou a Intercept, “Claudio Dantas se mostra um bom parceiro dos servidores públicos que, pela ética da profissão, ele deveria fiscalizar. O jornalista perguntou aos procuradores, em junho de 2017, quem a Lava Jato apoiaria na eleição da categoria para o cargo de procurador-geral da República, o chefe do MPF, o Ministério Público Federal. Dantas desejava se alinhar aos procuradores para, em suas palavras, ‘apoiar (o nome) certo’. Em resumo: o editor do site queria entrar em campanha com a Lava Jato”.

“Fundado por jornalistas que ajudaram a dinamitar a credibilidade da maior revista semanal do país, a Veja – ao torná-la um panfleto antipetista e ingrediente crucial na crise que afundou a editora Abril –, O Antagonista é bancado pela Empiricus, uma consultoria de investimentos que espalha panfletos catastrofistas (e habitualmente furados) em busca de clientes e já foi multada por propaganda enganosa”, detalha a Intercept Brasil.

Mesmo com tal currículo, acrescenta, “o site se tornou porta-voz da Lava Jato e, principalmente, de Sergio Moro. A própria Veja, em uma carta ao leitor publicada em julho do ano passado, fez uma autocrítica pela fase em que alçou Moro à condição de herói nacional imune a críticas. Na mesma edição, a revista publicou reportagem em parceria com o Intercept mostrando ilegalidades cometidas pelo então juiz da Lava Jato”.

Outro lado
Procurada pela agência, a força-tarefa da Lava Jato no Paraná disse que “não há qualquer favorecimento ou privilégio no fornecimento de informações” – o que é desmentido pela reportagem. Insistiu, ainda, que “as mensagens que são atribuídas à força-tarefa têm sido usadas de modo descontextualizado ou deturpado, para fazer acusações que não correspondem à realidade”, o que a Intercept – e o bom senso – repudiam.

“Ao longo da operação Lava Jato, foram recebidas informações sobre supostos crimes de diferentes fontes, jornalistas ou não. O procedimento adotado é realizar a investigação, o que pode ser antecedido, quando pertinente, por uma verificação preliminar da informação, autorizada pela lei”, concluiu a equipe de Dallagnol.