O alerta boliviano


Fernando Brito - Tijolaço

Evo Morales, na manhã de ontem, havia anulado as eleições das quais saída vitorioso, com dez pontos de vantagem, para convocar um novo pleito.

Era, evidente, uma derrota política a que ele se submetera e não há dúvidas de que enfrentaria uma oposição unida e forte, enquanto seus partidários tenderiam a murchar, abatidos por um reconhecimento implícito de que a vitória anterior estava maculada.

Questão de dias – um mês, provavelmente – para que se fizesse nova eleição e o país transitasse, em relativa paz, para um regime de direita.

Mas os líderes conservadores mostraram disposição zero de manterem-se dentro das regras democráticas.

A Polícia virou sua tropa, estimulando e garantindo barbaridades como a de queimar casas de líderes políticos e ministros do governo (prestem atenção nisso, adeptos dos “escrachos” e no que isso legitima) e o Exército apresentou, com vírgulas e linguagem “gentil” uma ordem a Morales: renuncie.

Numa palavra: entre o poder sem golpe e o com golpe, escolheram o segundo.

Não creem numa reação violenta de envergadura dos 47% que votaram em Morales e ou que dispõe das forças militares ou paramilitares para sufocá-la, se ocorrer. E a a falta de algum tipo de resistência organizada parece dar-lhes razão até agora.

Assim que se acertarem internamente, convocarão uma eleição do derrotado Carlos Mesa como candidato único – na prática, embora possam haver “nanicos” na disputa – ou de dois candidatos de direita, se tiverem crescido a tanto os apetites do líder “cívico” Luís Fernando Camacho, um fundamentalista que se comprometeu a “levar Deus e a Bíblia” de volta ao palácio presidencial.

É pouco provável que a maioria pró-Evo seja capaz de apresentar um candidato, o clima de violência e intimidação é grande demais para isso.

Os eventos na Bolívia, a seguirem na marcha em que estão – as informações da imprensa não são suficientes para que se veja o que se passa na Bolívia profunda – servem de alerta para que se veja – se é que o que vimos aqui não bastou – que a democracia na América Latina não é uma construção segura, mas um objetivo a conquistar.

Os tempos são outros, mas nem tanto, como se viu.