MILITARES PERDERAM O TREM


Os militares não pegaram o trem que estava na estação quando estourou o escândalo das conversas noturnas de Temer e Joesley, em abril de 2017.

A direita e a esquerda, jovens e idosos, empregados e patrões, homens e mulheres, puritanos e libertinos, paisanos e fardados, pobres e ricos, todo o mundo decepcionado ou revoltado diante do fracasso, da perversidade e da sujeira do governo ilegítimo.

Na contramão da indignação geral, atuavam o Congresso e o Supremo sob a batuta do presidente da República, que viria, após nem sequer ter tido coragem de se candidatar à reeleição, como pretendia, a ser preso e solto duas vezes, crivado de processos criminais por todos os lados quando ainda no cargo máximo da Nação.

Uma intervenção militar sem derramamento de sangue para pôr ordem na República e realizar as eleições de 2018 da maneira mais limpa, legítima e democrática possível, sob a supervisão de diversos organismos internacionais, e empossar os novos eleitos, era perfeitamente viável e aceitável, mansa e pacificamente.

Até ficou parecendo que os milicos iam intervir nessas condições. Se a missão fosse cumprida com êxito, um militar de escol também poderia se candidatar e ser eleito Presidente da República, sem “facada”, sem notícias falsas e com muito debate na mídia. A confiança nas Forças Armadas aumentaria, e ainda mais se fizesse um mea culpa e pedisse perdão pelo seu passado de perseguições, torturas, assassinatos e desaparecimentos, até porque no governo da presidenta Dilma Rousseff, uma de suas vítimas, as indenizações por danos profissionais, financeiros e morais já eram fato consumado.

Alegou-se na época que as Forças Armadas não tinham preparo nem estrutura suficientes para enfrentar o crime organizado, ou que poderiam se contaminar e cair de vez no descrédito.

E foi assim que o general Villas Boas e outros militares saudosistas dos anos de chumbo da ditadura militar de 1964/1984 preferiram se submeter ao governo extremamente corrupto, perverso e entreguista do presidente ilegítimo e apostar na candidatura do ex-capitão Jair Messias Bolsonaro, que havia sido expulso das Forças Armadas por má conduta, e de índole extremamente belicosa, a par de fazer apologia da tortura e do assassinato e de defender ostensivamente os carrascos.

Deu no que deu. A economia degringolou e o desemprego aumentou ainda mais, a paralisia, a desmoralização internacional, a perda de soberania e o alinhamento incondicional com os Estados Unidos deixadas pelo governo instalado em maio de 2016 se consolidou, o Centrão ficou mais forte e poderoso, misturou-se bíblia com fuzil, o TSE e o STF caíram de joelhos, amedrontados.

Agora, setores das Forças Armadas querem que o povo ocupe as ruas neste domingo paramentados de verde e amarelo, para “salvar a Pátria” que eles mesmos jogaram no atoleiro, sob pretexto de que “o Brasil não pode virar uma nova Venezuela”. Não por coincidência, o ativismo maior vem dos apólogos da perseguição, tortura, assassinato e desaparecimento de inimigos visíveis e imaginários.

Mas aí caem em contradição, pois exigem eleições limpas e sob supervisão internacional na Venezuela e, ao mesmo tempo, que os argentinos não elejam um opositor do presidente neoliberal Maurício Macri, sob pena de intervenção do Brasil, dos Estados Unidos, da Colômbia...

E ainda alegam que “todo poder emana do povo”, quando eles sabem muito bem que o poder legítimo se expressa pelo voto e não pelo grito, nem pelas armas, nem pelas milícias.

O trem da desgraceira já está em alta velocidade.



Boanerges de Castro