Pedágio no Paraná: Criminalista critica ação de marketing


"É mais grave quando a publicidade ocorre em favor de uma ficção jurídica, como no caso de uma operação, a qual, hoje, é identificada na figura de alguns poucos agentes do Estado", diz Luiz Flávio Borges D'Urso

Jornal GGN – O criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso assina artigo no portal Migalhas, nesta segunda (29), criticando um aspecto do acordo de leniência entre a Lava Jato e a concessionária Rodonorte: a cláusula que obriga a empresa condenada a produzir 8 peças do tipo outdoor atribuindo à Lava Jato um desconto de 30% (ou o índice que será aplicado) no valor do pedágio.

A mensagem deve informar ao cidadão que o “pedágio foi reduzido em 30% porque recursos provenientes de corrupção foram recuperados pela Operação Lava Jato e aplicados em benefício do usuário”.

Para D´Urso, “toda vez que se personifica a ação do estado em favor da publicidade de alguém ou de alguma instituição, afasta-se do propósito estatal que a lei estabelece, isto é mais grave quando a publicidade ocorre em favor de uma ficção jurídica, como no caso de uma operação, a qual, hoje, é identificada na figura de alguns poucos agentes do Estado.”

O criminalista ainda afirmou que determinar que uma condenada seja obrigada a dar créditos à Lava Jato [que sequer é uma instituição de Estado] por sua punição é a mesma coisa que obrigar réus absolvidos pela Justiça a fazer propaganda de seus advogados.

O acordo da Rodonorte foi assinado pelos procuradores de Curitiba liderados por Deltan Dallagnol.

Por Luiz Flávio Borges D’Urso

O indesejável marketing na Justiça

No Migalhas

O acordo de leniência celebrado com a empresa Rodonorte, concessionária de rodovias, negociado pelos procuradores da “Lava Jato”, estabelecendo 30% de desconto no valor do pedágio das estradas do Paraná, é uma solução muita boa e de interesse público, merecendo nosso aplauso.

Todavia esse acordo suscitou um amplo debate, quando estabeleceu, ainda, que a empresa deverá fazer propaganda, por meio de placas de 8 metros quadrados, colocadas nos pedágios, esclarecendo que esse desconto é concedido por causa da “Lava Jato”. Trata-se de uma ação de marketing compulsória estranha a nosso Direito.

Ao se examinar o texto que deve ser objeto da propaganda, que diz: ”O valor do pedágio foi reduzido em 30% porque recursos provenientes de corrupção foram recuperados pela Operação Lava Jato e aplicados em benefício do usuário”, tem-se a impressão que a “operação Lava Jato” seja uma instituição juridicamente constituída.

E mais, cria-se uma obrigação que se poderia comparar a uma hipotética exigência estabelecida nas sentenças condenatórias, de que a punição foi aplicada graças ao juiz da causa, que, pela imposição da pena, estaria beneficiando o cidadão.

Toda vez que se personifica a ação do estado em favor da publicidade de alguém ou de alguma instituição, afasta-se do propósito estatal que a lei estabelece, isto é mais grave quando a publicidade ocorre em favor de uma ficção jurídica, como no caso de uma operação, a qual, hoje, é identificada na figura de alguns poucos agentes do Estado.

Imagine-se obrigar os alvos da ação estatal criminal a dar o crédito de seu insucesso delituoso à policia civil ou militar que atuou no caso, ou ainda declinar que foi o Ministério Público (que o denunciou) quem deve ser o destinatário do reconhecimento pela punição recebida, ou talvez que o Magistrado sentenciante deve ser reconhecido pelo serviço prestado.

Se isso fosse admitido, chegaríamos ao absurdo de se estabelecer, nas sentenças, a obrigação do réu, nos casos de absolvição, sempre que viesse a se manifestar, a atribuir à advocacia ou ao advogado fulano de tal, a obtenção de sua inocência.

O aparelho criminal estatal é formado por muitas instituições e incontáveis agentes, que agem, não em nome próprio, mas em nome do Estado e, por esta razão, a prestação jurisdicional (aqui entendida como todas as formas de solução de conflitos com a intervenção do Estado), deve manter o caráter impessoal de sua atividade.

A Justiça não precisa de marketing ou de propaganda, pelo contrário, deve pautar-se pela discrição, cumprindo a lei de forma impessoal, realizando a esperada prestação jurisdicional e, por causa disso, deve ter seu reconhecimento e mérito.